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CAU repudia demolições de residências no Tororó

Foi com perplexidade que tomamos conhecimento da operação de demolição de residências efetuada pela Prefeitura Municipal de Salvador, com o apoio da Guarda Civil Metropolitana, na Rua Monsenhor Rubens Mesquita (Tororó), em plena época de pandemia – onde mais do que nunca os lares são a nossa proteção, nosso abrigo, enfim nosso porto seguro.

Tais demolições, que tanto afligem a comunidade do Tororó, fazem parte de um conjunto de ações para desocupação da área com vistas à implantação de um Shopping Center na região. Quatro pontos merecem destaque e fazem com que nós, do Conselho de Arquitetura da Bahia – CAU/BA, estranhemos e repudiemos tal atitude:

* Primeiramente, é importante ressaltar que a localidade formada pela citada rua e seu entorno foi delimitada enquanto Zona Especial de Interesse Social – ZEIS, conforme LOUOS – Lei de Ordenamento do Uso e Ocupação do Solo de Salvador (Lei 9148/2016), em consonância com as diretrizes estabelecidas pelo PDDU – Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (Lei 9069/2016). Todavia, em que pese o artigo 42 do Estatuto da Cidade (Lei 10257/2001), que em seu inciso V traz a “previsão de áreas para habitação de interesse social por meio da demarcação de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana”, a comunidade do Tororó vem assistindo a um processo diametralmente oposto ao preconizado no referido artigo, uma vez que desde 2017 vem se intensificando um conflito fundiário entre os moradores da região e o poder público, conflito iniciado em 2013 por força de um contrato de concessão firmado entre a Prefeitura e a empresa Nova Lapa Empreendimentos Ltda. – pelo qual seria construído um Shopping Center sobre a Estação da Lapa, hoje administrada pela citada empresa –, motivando a remoção de dezenas de edificações construídas na localidade ao longo dos anos.

Ou seja: em vez de fazer cumprir a função social, provendo de infraestrutura as comunidades, o poder público faz exatamente o oposto, retirando as famílias dos seus espaços de habitação e convivência. Além disso, ressalte-se que, ainda que as famílias que ocupavam as casas demolidas tenham sido previamente indenizadas, a notícia que se tem é de que as demolições não têm sido feitas com o devido cuidado, não levando em consideração por exemplo as edificações vizinhas, que vêm apresentando rachaduras. Cabe ainda, com relação às demais famílias, perguntar: Será que se esgotaram todos os diálogos, todas as negociações já iniciadas junto à Defensoria Pública?

* Em segundo lugar, do ponto de vista do impacto de um Shopping Center composto por quatro pavimentos (de acordo com o projeto divulgado pela própria Prefeitura em 2015), era de se esperar que a implantação de um empreendimento de tal porte e em tal localização fosse objeto de ampla discussão junto à sociedade, tendo em vista se tratar de um Empreendimento Gerador de Impacto na Vizinhança (EGIV) e Polo Gerador de Tráfego (PGT), conforme artigos 135 e 137 da LOUOS 9148/2016 mencionada acima, cabendo portanto a avaliação cuidadosa, democrática e transparente dos Relatórios de Impacto na Vizinhança (RIV) e de Impacto no Trânsito (RIT), o que não ocorreu.

* Outro ponto importantíssimo a ressaltar é que o Shopping Center está previsto para ser implantado sobre a Estação da Lapa (projetada pelo falecido arquiteto João Filgueiras Lima, o nosso saudoso Lelé), construção de indiscutível representatividade arquitetônica, e cujas referências marcantes há muito já se consolidaram como espaço intensamente presente no imagético da paisagem urbana de Salvador, merecendo atenção especial qualquer intervenção nela sugerida, principalmente em se tratando de um empreendimento tão impactante como o Shopping Center proposto.

* Por fim, causa estranheza a informação veiculada na imprensa na data de 27/10/2021, em que o Prefeito informa que “as demolições foram necessárias para a gente iniciar a segunda etapa do BRT, que vai da estação da Lapa ao Cidade Jardim e encontrar com a primeira que está praticamente pronta e a terceira que ficará pronta em fevereiro (…) Ali no Tororó será feito um pátio para integrar o BRT com a Estação da Lapa”. Neste aspecto, é imprescindível lembrar que em momento algum o BRT havia sido mencionado neste processo de remoção da comunidade, o que reforça mais uma vez a pouca (ou nenhuma) transparência de todo o processo.

Assim, o CAU/Bahia se solidariza com a Comunidade do Tororó neste momento tão inusitado – onde o mínimo que se espera é um pouco de empatia, sensibilidade e acolhimento –, ao tempo em que se une às demais entidades que já se debruçaram sobre o problema, reiterando o posicionamento contido na nota conjunta elaborada em novembro de 2020 pelo Sindicato dos Arquitetos do Estado da Bahia (SINARQ-BA), Instituto de Arquitetos do Brasil / seção Bahia (IAB-BA) e Grupo de Pesquisa Lugar Comum, do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFBa (PPGAU/FAUFBa), nota que se encontra disponível no site do SINARQ-BA (www.sinarqba.org.br).

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