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A cidade da Bahia, Salvador, e as águas, nem sempre só as de março…

Foto: Unsplash

 

“A cidade da Bahia, Salvador, faz este ano, em 29 de março, 473 anos da sua fundação, pelo português Tomé de Souza, a mando do rei D. João III, de Portugal. Foi, também, a primeira cidade planejada das Américas. Luís Dias, seu construtor e mestre de obras, e sempre referenciado, erroneamente, como seu projetista em vários livros e documentos sobre a cidade, na realidade apenas trouxe os conceitos da sua provável localização e implantação de ser uma cidade fortaleza, como convinha à época, e tendo o seu traçado básico, idealizado pelo arquiteto e engenheiro real Miguel de Arruda (1500/1563).

 E, exatamente como ocorre atualmente, a região chovia muito nesta época, e devido a sua topografia muita acidentada, eram comuns deslizamentos de terras. E o próprio Luís Dias, relata que em razão das chuvas intensas, durante a construção das paliçadas iniciais, alguns trechos ruíram, dificultando as obras, tais como acontece em dias recentes.

Esta pequena introdução histórica é para fortalecer as colocações vindouras. Todos os anos as notícias não mudam, variam apenas na intensidade dos números de mortos e feridos, como também nos prejuízos da população menos privilegiada em recursos, ao perderem tudo, ou quase tudo. Ao buscar resolver a sua moradia, vai se ajeitando em qualquer lugar. Lugares nem sempre adequados em termos de segurança, nem lhe favorecendo o mínimo de dignidade humana. Construindo sem parâmetros de segurança e desconhecendo as condições de estabilidades de solos, com os prováveis alagamentos, por proximidades de leitos d’águas, ou das encostas, que ao perderem sua camada vegetal, exatamente por implantações inadequadas das habitações e seus acessos, favorecem os deslizamentos, e com as erosões, ajudam a canalizar as águas e potencializar as forças das mesmas, gerando os resultados já por demais vistos.  

São fatos conhecidos por todos, tanto pelas vítimas, quanto pelos técnicos e, claro, pelos os gestores municipais de plantão, e quais são os locais onde ocorrem estes fenômenos, estando estes já mapeados, há bastante tempo. Tanto que existem sirenes, que são acionadas quando o perigo está eminente.  

Sim. Fica a pergunta:

Qual a dificuldade da sociedade, dita organizada, de montar um projeto de relocação desta população, dentro de um planejamento técnico e social, priorizando de imediato os locais mais perigosos, dando as soluções necessárias e existentes de Arquitetura, Urbanismo e das diversas Engenharia?

Seria uma equipe permanente de profissionais interdisciplinares em planejamento, arquitetura e construção trabalhando constantemente até equacionamento dos pontos cruciais, aplicando técnicas e soluções com e para as populações dos locais mapeados, e não deixando acontecer novas ocupações irregulares. Aliás, nem isto, de se ter uma fiscalização ostensiva temos, apesar de todas as facilidades e técnicas inteligentes já existentes, tais como drones para uma possível fiscalização inicial sem sair de uma sala, todavia tendo contato com equipes operacionais móveis, para evitar novas ocupações indevidas. Seria o retorno da municipalidade em planejar a cidade com equipes e coordenação centralizada, não atitudes projetuais pontuais e independentes, das quais as diversas Secretarias de Governo desconhecem entre si, como tem sido praxe, após a década de setenta do século passado.    

Está na hora das universidades, das entidades profissionais, dos vereadores e dos gestores municipais dialogarem para construção de uma agenda com um projeto de estado, com orçamento definido, para resolver, ou ao menos amenizar, algo que é constante e não é mais surpresa para ninguém de onde e quando ocorrerá. O onde já é conhecido. O quando depende da variação e da intensidade das chuvas.

E é uma situação nacional, ocorrendo na maioria das cidades, e em diversas escalas de tamanho e população. Não sendo provocada só por leigos e inabilitados, ao tentar resolver suas necessidades básicas para morar, mas também por profissionais habilitados, que por incompetência mesmo, ou para atender as vontades dos seus contratantes ou dos gestores de plantão, continuam abordando, projetando e construindo a cidade de modo tecnicamente inadequado.

Enfim, solução há.

Falta sim, decisão e vontade política do gestor, e este ser mais sensível as tragédias humanas e sociais. Como também da sociedade que acha que as doações são soluções, não algo só imediato e paliativo para as dores e perdas materiais e humanas naquele momento. Temos que ir bem mais além. Temos que interromper este movimento cíclico e constante, destas tragédias esperadas, e já anunciadas.

 BASTA.”

Arquiteto e Urbanista Neilton Dórea
Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo da Bahia
No 473° aniversário da Cidade da Bahia, em 29/03/2022 quase findando a pandemia de COVID 19, mas ainda com a insensibilidade dos que podem resolver, mesmo sendo votados para trazer soluções.                   

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