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Arquitetura e Urbanismo para todos: Debate sobre os desafios da habitação social

Painel de Assistência Técnica fez parte da programação da II Conferência Nacional de Arquitetura e Urbanismo

 

 

Cerca de 85% das obras realizadas no Brasil são feitas sem o acompanhamento técnico de arquitetos ou de engenheiros. Uma parcela enorme da população que busca seu direito à habitação em áreas sem infraestrutura, regiões de encostas e residências insalubres, pondo em risco sua saúde e segurança. Arquitetos e urbanistas reunidos na II Conferência Nacional de Arquitetura e Urbanismo debateram formas de solucionar esse problema, a partir de experiências realizadas no Rio de Janeiro e em Brasília. O painel “Arquitetura e Urbanismo para Todos – Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social” teve como debatedores os arquitetos Demetre Anastassakis, responsável pelo projeto do Conjunto da Maré, no Rio de Janeiro; Jorge Mário Jauregui, que fez a urbanização de mais de 20 favelas; e Gilson Paranhos, presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (Codhab-DF).

 

A Codhab-DF está realizando desde 2015 um projeto revolucionário na periferia de Brasília, com a instalação de dez postos de assistência técnica em comunidades, 50 mutirões de renovação urbana, 12 concursos públicos de Arquitetura e mais de 30.000 escrituras entregues. Ele defende que os arquitetos e urbanistas precisam promover uma mudança cultural para emfrentar os desafios da habitação social. “Temos que mudar o foco. Nosso produto final é o papel e imagem, e não a obra ou a cidade como deveria ser”, afirmou. “Temos uma baixa estima muito grande e não acreditamos na capacidade de transformação das cidades.”

 

Gilson destacou ainda que não podem deixar que os departamentos jurídicos de órgãos públicos decidam o que deve ser feito, sem contestação. “Nós viabiliamos o fatiamento do projeto quando o jurista não deixa contratar vencedor de concurso. A lei manda fazer concurso público, mas quando fazemos, temos que justificar. É o contrário: quem não faz concurso é que tem que justificar.” Isso acontece também com os arquitetos que aprovam projetos e seguem normas de forma acrítica. “Temos que enfrentar isso, senão não vamos mudar nossas cidades, não podemos ter medo de assinar aquilo que sabemos que é melhor. A Caixa Econômica não ia financiar a casa da Dona Dalva por causa das normas. Caixa e Ministério das Cidades não entendem nada de projeto.”

 

Gilson Paranhos, presidente da Codhab-DF

 

ARQUITETOS DEVEM PROMOVER INICIATIVAS

O arquiteto e urbanista Demetre Anastassakis, ex-presidente do IAB, é veterano em projetos de habitação popular. Seu projeto para o Conjunto da Maré foi exposto na Bienal de Arquitetura de Veneza. Ele convocou os arquitetos e urbanistas a buscar terrenos dsponíveis, movimentos sociais e empreiteiras para fazer as habitações de interesse social. “Arquitetos podem fazer um prédio sem esperar governo nenhum, o governo não empreende, só cria as condições. Neste caso, as condições estao postas. Tem R$ 350 bilhões disponíveis do FGTS, e a gente não pega. Vamos começar”.

 

Ele contou que fez isso em parceria com uma empreiteira em Novos Alagados, com todas as unidades vendidas a R$ 35.000 cada, em menos de um mês. “Se tiver um arquiteto que quiser construir um Copan com o dinheiro Minha Casa Minha Vida, ele consegue. Não faz porque não quer”, afirmou. “Eu fabrico meu próprio trabalho, faço incorporação, faço contrato, converso com movimentos sociais, uso Minha Casa Minha Vida Entidades. Não estou esperando uma empresa encomendar um projeto, porque elas não vão. Nós fizemos o pioneiro projeto popular de uma grande empreiteira. Uma coisa concebidas por nós, que nós propusemos, com projeto pronto, que nós negociamos com os movimentos sociais.”

 

Demetre faz a mesma proposta em relação às ações de Assistência Técnica em Habitação Social. “As pessoas ficam esperando regulamentar a Lei de Assistência Técnica no estado, no município. Aloca recurso e vamos em frente. Não tem que esperar uma lei estadual para cumprir uma lei federal, isso é uma burrice”, disse. Para o arquiteto Jorge Mário Jauregui, argentino radicado no Brasil e responsável pelos projetos de reurbanização de mais de 20 favelas cariocas, a principal característica da sociedade contemporânea é sua divisão, completamente heterogênea. O papel do arquiteto e urbanista deve ser o de promover conexões entre esses setores, escutando as demandas da população e fazendo projetos que sejam inteligíveis e democráticos. “A função social do arquiteto consiste precisamente em dar coerência ao conjunto de demandas sociais difusas, outorgando-lhes uma visibilidade que permita a ação. Hoje existe a necessidade de retomar o caminho das políticas urbanas voltadas para as favelas, como uma prioridade.”

 

Jorge Mário Jauregui

 

ÉTICA E ESTÉTICA
Jorge Mário considera que o tema da habitação de interesse social é um assunto de múltiplas entradas. Envolve questões éticas , questões estéticas (articulando cultura popular com saber disciplinar), e questões políticas. Ele exemplificou essa atuação apresentando uma metodologia de projeto de melhorias habitacionais aplicada no Rio de Janeiro, em 287 casas no Complexo do Alemão, no entorno das estações Adeus e Palmeiras. A metodologia tem seis passos: questionários com vistorias, construção de bases de dados, definição dos kits, atribuição dos kits às unidades, composição de preços e orçamento. Foi projetada uma casa-protótipo para se analisar questões de viabilidade da construção e orçamento. No projeto também foram planejadas vias de acessos entre as casas e a criação de hortas e centros comunitários, incluindo a fabricação de tijolos ecológicos, fabricados nos próprios canteiros de obras.

 

Neste caso, foi entregue o projeto básico ao Governo do Rio Janeiro, mas a construção foi interrompida por causa da grave crise financeira que o Estado atravessa. Os outros debatedores destacaram que a falta de vontade política é outro fator que impede a democratização da Arquitetura e Urbanismo. “Valor do automóvel médio é o valor de uma casa média. No momento que o país tomar a decisão de resolver o problema habitacional, em três anos se resolve”, afirmou Gilson. “Melhoria habitacionais são essenciais, especialmente para edifícios abandonados no centro da cidade. Nós arquitetos temos que mostrar isso para sociedade, ir para a briga politica concreta”.

 

Demetre destacou que várias experiências feitas em décadas anteriores foram completamente abandonadas. “Nessa época de privatizações, ninguém fala mais nisso. Urbanização é dívida pública. Eu não consigo imaginar uma nação em que a gente não consegue consertar favelas. É uma vergonha total nossa e o CAU tem um papel muito importante para mudar isso.”

 

Fonte: CAU/BR

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